Caro amigo e irmão Jorge,
Ao me ser comunicada a notícia da tua morte, imediatamente me vieram à
mente as palavras de Marta a Jesus a propósito da morte de Lázaro: «Senhor, se
Tu cá estivesses, o meu irmão não teria morrido». Apliquei-as a mim… de facto,
eu não estava, apesar de querer muito estar. Como Jesus, também eu chorei. No
dia 22 de Setembro vi-te pela última vez, sabendo que provavelmente nunca mais
te veria nesta vida. Não fui capaz de me despedir, a não ser um simples A-Deus.
Sim, um «até Deus» profundamente consciente, quiçá resignado, por saber que
apesar de seres um lutador, a luta que te esperava era unicamente a da
dignidade até ao fim.
É verdade que hoje as nossas lágrimas caem, mas o nosso coração está
alegre. Pois nos apoiamos nas palavras de Jesus em resposta a Marta: «Eu sou a
ressurreição e a vida. Quem crê em mim, mesmo que tenha morrido, viverá». Um
dia, Jorge, disseste que há muitos anos atrás começaste a escavar um buraco e
que quando ele já estava fundo, te lançaste lá para dentro. Mas que, na
escuridão que ele te possuía, Deus irrompeu com a Sua luz e te resgatou do
buraco. Sabes porquê Jorge? Porque não tens que ser tu a cavar a tua sepultura,
é o Senhor que a prepara. A nossa sepultura tem que estar impregnada com o
suave perfume e aroma da ressurreição. É essa sepultura que agora te espera,
aquela que se constrói pela fé, esperança e caridade que nestes últimos tempos
aprendeste a viver e testemunhar. Deus fez-te sair da morte, como a Lázaro,
para te dar a possibilidade de um novo encontro, de um novo caminho, de uma
nova luz. E tu agarraste bem. Provavelmente, nestes últimos anos viveste os
melhores momentos da tua vida. Encontraste a Mãe Igreja concretizada na comunidade
que te acolheu, apoiou e sustentou; entraste na família de muitas casas, onde a
minha se inclui. Mostraste a veracidade do Evangelho, de que «Deus escolhe os
fracos para confundir os fortes». Desafiaste as leis da natureza e os limites
da razão, mostrando na carne que «a Deus nada é impossível». Não fizeste uma,
duas ou três, mas cinco peregrinações a Fátima. Por isso, Jorge, és não um
herói mas uma verdadeira referência para tantos, como comprova esta assembleia
aqui reunida para por ti rezar.
Na nossa última conversa, disseste que já não poderias ir mais a Fátima a
pé, mas que gostarias de ir no apoio. Mas Deus trocou-te as voltas: vais mesmo
a pé, nas mochilas, nos bastões, nos corações e na mente de todos os peregrinos
que te conheceram. És o melhor peregrino que conheço, e dificilmente alguém te
baterá na vontade e capacidade de superação.
Jorge, hoje confiamos-te ao Pai… fica a saudade da tua presença connosco,
mas a certeza da tua presença em nós. Fica a nostalgia da tua voz a chamar
«paizinho» e os dois beijos que davas, sem preconceitos mas com a ingenuidade
de criança, a gratidão que cultivavas e a pureza de coração que todos te
reconhecem. Neste momento, desejamos que possas contemplar Aquele Jesus que
orgulhosamente trazias ao peito e que de forma tão desajeitada evocavas quando
fazias o sinal da cruz.
Por tudo te queremos dizer: Obrigado. Foste, és e
continuarás a ser uma referência para todos nós. A tua memória poderia ser
imortalizada numa merecida biografia, mas contentamo-nos em guardar o teu
sorriso, os teus gestos e a tua amizade nos nossos corações. Hoje te dizemos:
a-Deus, Jorge, «filhinho», até um dia… até Deus. Até lá, pede por nós ao Pai e
faz de nós bravos peregrinos como tu foste, sê uma estrela na nossa estrada
para o Céu. De hoje em diante, sei que não terei apenas um, mas dois anjos da
guarda. Descansa em paz. Ámen.
Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas; se não fosse assim, eu vos teria dito. Vou preparar-vos lugar. (João 14:1-2)
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