Com o início do tempo do Advento damos igualmente
início a um novo ano litúrgico e consequentemente a um novo ciclo de leituras,
sendo que ao longo deste ciclo (Ano C) teremos a oportunidade de acompanhar de
forma mais continuada o evangelista S. Lucas. O tempo de advento divide-se em
dois momentos, que nos focalizam em outros tantos conteúdos: a esperança
messiânica e a vinda definitiva de Jesus no fim dos tempos (até dia 16 de
dezembro) e a preparação próxima da vinda histórica de Jesus e da celebração
litúrgica do Seu nascimento (de 17 a 24 de dezembro). É sobretudo o convite
incessante à preparação para o encontro com o Senhor, seja na última vinda seja
na experiência litúrgica do encontro, que ecoa aos nossos ouvidos durante este
tempo.
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A
esperança na vinda de alguém que viesse restituir a justiça e estabelecer a
paz, nomeadamente em tempos de instabilidade e guerra, era (e é) um dado
incontornável da fé judaica. Assumindo várias configurações ao longo dos
séculos (de tipo político, religioso, sacerdotal ou até uma entidade coletiva),
esse Messias esperado foi alimentando a espiritualidade do povo eleito e
reforçando a certeza de que as promessas de Deus se cumpririam. É este pano de
fundo que preside à leitura do profeta Jeremias, imagem que também Isaías usa e
que a tradição cristã irá aplicar em relação à identidade messiânica de Jesus:
«farei brotar para David um rebento de justiça». Para nós cristãos, o horizonte
é outro. Esse Messias esperado pelo povo veterotestamentário reconhecemo-lo em
Jesus de Nazaré: é n’Ele que se cumprem todas as expetativas e esperanças do
Povo de Deus. Nesse sentido, e porque a vinda histórica de Jesus já se efetuou
e agora permanece como memória e fonte da vida cristã, o advento de hoje é a
espera (e esperança) da última vinda do Senhor, como afirmamos na Santa Missa:
«Vinde, Senhor Jesus» (tradução do refrão adventício «Maranatha»).
Os
primeiros textos do Novo Testamento manifestam esta preocupação e necessidade
imediata de preparar a vinda iminente do Senhor. A segunda leitura de hoje é
prova disso mesmo. A 1ª epístola de S. Paulo aos Tessalonicenses, o primeiro
dos livros do Novo Testamento a ser escrito, focaliza-se, do princípio ao fim,
na segunda vinda do Senhor. Paulo convida a comunidade cristã de Tessalónica a
preparar os seus corações e as suas vidas para esse encontro através da
vivência das virtudes cristãs, nomeadamente a caridade e a procura de uma
«santidade irrepreensível». Paulo combate e adverte para não cair na apatia; é
importante «progredir ainda mais».
O
tempo do advento convida-nos, por isso, a caminhar com esperança ao encontro de
Cristo. Este caminho faz-se pelo progresso da vida espiritual, tal como ouvimos
anteriormente, sem nos regermos pela mediania ou mediocridade de critérios ou
saciados com o que já fizemos ou somos. Não podemos dar por certa a nossa
salvação por nos considerarmos suficientemente crentes. Paulo exortava as suas
comunidades, como a de hoje, a não se deixar alienar perante a iminência da
vinda de Cristo, mas a continuar a lutar para alcançar a salvação. Isso mesmo
nos diz Jesus no evangelho de hoje, advertindo para que os seus interlocutores
(de ontem e de hoje) não deixem que os seus corações se tornem insensíveis e
fechados aos sinais divinos. No fundo, devemos ver esta «santidade irrepreensível»
como uma questão de vida ou de morte, como a grande questão da existência
cristã.
O apelo a «vigiar e orar» mais
não é do que um convite a ter a mente e o coração no registo certo. As inúmeras
solicitações da vida, muitas delas importantes, não podem reduzir a fé a uma
mera devoção (e muito menos superstição). Deus tem de ser levado a sério, e
sobretudo provocar uma resposta de conversão e mudança de vida. Tudo aquilo que
esmaga o espaço de Deus nas nossas vidas (aqui simbolizados na intemperança, embriaguez
e preocupações da vida) faz-nos escravos e impede essa libertação próxima
anunciada por Jesus. Se é verdade que essa realidade encontra a sua plenitude
na última vinda de Jesus, a Sua permanência na vida da Igreja mediante o Seu
Espírito, a Sua Palavra e os Seus Sacramentos exigem de cada um de nós uma
atitude constante de atenção. Ler os sinais de Deus na história de hoje é
condição sine qua non para que o
Senhor venha à nossa vida e não nos encontre desprevenidos. E ter esta leitura
é estar inteiro nas coisas (na missa, por exemplo) e atento à presença de Jesus
que vem ao nosso encontro (na Escritura, na misericórdia, na pessoa dos pobres
e outros nossos irmãos). O tempo do advento, muito preenchido do ponto de vista
social, com todas as solicitações, festas e apelos, não nos deve desfocar do
essencial deste caminho nem deve obstaculizar a vinda de Jesus aos corações dos
cristãos.
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