segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

O ano da misericórdia (também) na cultura: sabor a Caravaggio


Sou um apaixonado pela arte pictórica de Caravaggio, autor italiano dos finais do século XVI e princípios do século XVII. Procuro, no tempo que a minha disciplina pessoal permite, ir cruzando o meu olhar e o meu coração com as obras de arte deste autor aqui em Roma, e que são ainda algumas. Mas num ano em que celebramos o Jubileu da Misericórdia, partilho aqui convosco uma pintura que tive a graça de contemplar na cidade de Nápoles, mais concretamente na igreja do Pio Monte della Misericordia. Esta obra, realizada no princípio do século XVII, tem como título «As sete obras de misericórdia», e espanta pela capacidade do autor em concentrar, numa única cena, aparentemente ligada à vida napolitana, a representação das sete obras de misericórdia espirituais. 

As sete obras de misericórdia neste quadro de Caravaggio identificam-se da seguinte forma:

  1. «Sepultar os Mortos»: está representada à direita, em que se observa um cadáver a ser transportado (somente os pés se vislumbram), um diácono que traz consigo um archote e um 'transportador' do defunto;
  2. «Visitar os presos» e «dar de comer a quem tem fome» vem representada nas mesmas personagens e num mesmo episódio: aquele de Cimone, no romance de Valerio Massimo (séc. I d.C.), em que este, condenado à morte através da fome, nutriu-se do seio da sua filha, Pero, e por isso agraciado pelos magistrados com um templo ali erecto dedicado à Deusa Piedade (onde mais tarde viria a ser construída a Basílica de S. Nicolau no Cárcere);
  3. «Vestir os nus»: aparece na parte esquerda, concentrada na figura de um jovem cavaleiro, provavelmente S. Martinho de Tours, e que oferece o seu manto a um homem visto de costas e que aparece desnudado; ao mesmo santo está ligada a figura de um aleijado, em baixo, num ângulo mais à esquerda, que evoca um episódio relacionado com a vida de S. Martinho, e aqui associado à obra «Cuidar dos enfermos»;
  4. «Dar de beber a quem tem sede» está representada por um homem que bebe de uma mandíbula de burro, provavelmente Sansão, que no deserto bebe água surgida miraculosamente por parte de Deus;
  5.  «Hospedar os peregrinos» está bem definida por duas figuras: um homem em pé, na extrema esquerda do quadro, que aponta para um qualquer lugar exterior, e um outro que, devido ao uso de uma concha no chapéu (símbolo do Caminho de Santiago de Compostela), se identifica facilmente como sendo um peregrino.

O Papa Francisco diz que o nome de Deus é misericórdia. Que procuremos, também, contemplar o rosto do Deus Misericórdia na revelação que faz de Si nas obras de arte, como Caravaggio tão bem soube manifestar.


Sem comentários:

Enviar um comentário